Vivemos num mundo novo com uma cabeça velha. Diante da crise de todos os grandes fundamentos e modelos explicativos, ao invés de aproveitarmos a chance de experimentar o vazio que é próprio da nossa existência, ou finalmente criar algo de novo, fazer um pouco de arte contemporânea, nos agarramos às velhas fórmulas do passado já tão gastas e apodrecidas. Todas as instituições, sejam quais forem – políticas, sociais, culturais, familiares, religiosas – querem nos dizer quem somos nós, o que podemos e o que devemos fazer. Em parte por preguiça, em parte por covardia, acreditamos em qualquer lixo sagrado que o passado produziu. Fazemos de tudo para não termos que nos olhar no espelho livres da falsa familiaridade que construímos com aquele nosso reflexo e finalmente encarar a verdadeira questão, a questão que ele nos põe todos os dias, mas da qual fugimos cada vez mais assustados: Quem é aquele estranho nos encarando do lado de lá? E quem é esse estranho para o qual ele olha do lado de cá? Precisamos encarar o estranhamento. O nosso estranhamento.
Estamos vivos e o que é que nos interessa? Ocupar nosso tempo o máximo possível até que nos esqueçamos por completo de que estamos vivos. Levamos a sério nossas brincadeiras – nossa formação, nosso trabalho, nossas obrigações, nossos deveres. Fingimos, ou – o que é mais triste – acreditamos de fato que o teatro social de cada dia é o que há de mais importante. No resto do tempo nos entregamos aos divertimentos baratos e sem sentido que em nada nos acrescentam. Vivemos na era da diversão barata, ininterrupta, ao alcance de todos todo o tempo e também – paradoxo? – do anti-depressivo. Os bichos que enjaulamos para nos tornarmos esses animais domesticados agora devoram nossas entranhas. Já comeram nossas almas, agora comem nossos nervos. É isso mesmo? É só isso? Uma passagem rápida pelo planeta Terra, com obrigações muito sérias e algum divertimento barato? Uma passagem a mais cômoda possível? A mais apagada possível? É o que? O que estamos fazendo aqui afinal?
Até quando vamos continuar estabelecendo ligações diretas com o Além? Até quando vamos trocar figurinhas com deuses, almas, espíritos, fadas e fantasmas, anjos e demônios? Até quando vamos continuar acreditando que existe uma ordem moral para o mundo? Que a vida tem um propósito, um sentido? Até quando vamos acreditar que “Freud explica” ou que a ciência prova? Até quando vamos passar adiante a sabedoria que não temos? Lá onde se fala em humanidade, eu vejo zumbis, máquinas programadas, mas não artistas, não pensadores, não grandes personagens. Não há mais protagonistas, só coadjuvantes. Não há mais nada, humanidade? Nada?
Atualização da mente: Baixar?
Atualização da mente: Baixar?