Friday, December 05, 2008

Qual é o modelo que devemos seguir?

É natural que, de quando em quando, nos façamos esta pergunta. Se não exatamente assim, por meio de variantes como: O que devo fazer? Como devo agir? Tenho agido mal? Tenho agido certo?

E estamos tão acostumados a pensar dessa maneira, que nem nos damos conta do tamanho dos pré-conceitos camuflados na pergunta: "Qual o modelo que devemos seguir?"

Esta simples questão pressupõe duas pequenas verdades absolutas herdadas da tradição platônica e cultivadas pela tradição cristã:
1 - Há um modelo verdadeiro, perfeito, absoluto.
2 - Ele deve ser seguido.

Caso não estejam familiarizados com as teorias de Platão:

A questão do modelo é a base da Filosofia de Platão. Para ele, o mundo que vemos, percebemos e no qual vivemos, é ele mesmo e cada elemento seu, uma cópia imperfeita de um modelo perfeito, único e real. A estes modelos perfeitos, deu o nome de “Idéias” e descreveu até um “lugar” para elas: O Mundo das Idéias. Para ele, o mundo real. Reafirmando para ficar claro: O mundo real é o mundo das idéias. O mundo no qual vivemos é apenas um cópia do primeiro.

Ao nosso mundo, deu o nome de “Mundo Sensível”, porque percebemos tudo aqui através dos sentidos. De fato, nossa percepção aqui é construída com base no que vemos, ouvimos, tocamos... E segundo Platão, nós, cópias imperfeitas, através dos sentidos, só poderíamos mesmo obter um conhecimento imperfeito de cópias imperfeitas dos modelos perfeitos do mundo das idéias.

Já no Mundo das Idéias, o qual chamou “Mundo Inteligível”, é onde poderíamos obter o verdadeiro conhecimento, contemplando as idéias imutáveis e perfeitas através da inteligência e da alma. Talvez, “obter” o conhecimento não seja o termo mais preciso. Melhor seria dizer “relembrar” o conhecimento, já que Platão acreditava que nossa alma conhecia anteriormente o "mundo das idéias", porém, antes de vir para nosso corpo e nosso mundo, tivera de beber do “rio do esquecimento”, cujo efeito, todos já podem imaginar. Muito bem, prosseguindo as descrições e diferenças dos dois mundos: enquanto aqui as cópias são múltiplas e mutáveis, as idéias são unas e mutáveis. Por exemplo: existem diversos tipos de caneta, mas o que faz com que quando vemos uma caneta, a reconheçamos como sendo caneta, é a existência da idéia una e imutável de caneta, no mundo das idéias.

Platão imaginou ainda, uma idéia superior. Uma idéia suprema. Assim como o sol fornece a luz que nos permite ver, esta idéia fornece à inteligência a luz que nos permite conhecer: A idéia de Bem. Fica claro assim, que na filosofia platônica, há um modelo para tudo. Há sempre modelos que devem ser seguidos. Há um modelo de justiça, um modelo de bondade, um modelo de beleza... E a tarefa mais relevante e nobre que poderíamos empreender, seria contemplar os modelos para nos aproximarmos o máximo possível deles em nossa vida, em nossos pensamentos e em nossas atitudes. Esta é a base da filosofia de Platão. Esta crença no “modelo” – verdade única, perfeita, imutável e universal – é continuada e reafirmada pelo milênio de dominação cristã do pensamento ocidental na Idade Média.

Nós, que - sabendo ou não, querendo ou não - temos nossas cabeças formatadas pela tradição platônico-cristã, vivemos nos perguntando: "Qual o modelo que devo seguir?"

Mas, parem para pensar: Há mesmo modelos? Há alguma necessidade de haver modelos? E quem pode dizer que este mundo no qual vivemos não é perfeito assim mesmo como é? Por que essa necessidade de imaginar um mundo verdadeiro, um mundo além, onde tudo é uno e imutável? Por que não reconhecer a perfeição neste mundo de mudanças e contradições em que vivemos?

Qual o modelo, portanto, de normalidade? E o modelo de sanidade? Qual será? Que são todos os loucos, afinal, se não pessoas que não seguem o modelo que não existe?

Como dizer que existe um modelo verdadeiro? Ora, não há modelos que devam ser seguidos!

Antes então de nos perguntar qual o modelo, ou se o estamos ou não seguindo, paremos para pensar: Por que tem de haver um modelo?

5 comments:

Anonymous said...

O melhor "modelo" a seguir - ou criar - é o que nos traga felicidade. Se não traz, não é para ser seguido e/ou vivido.

Anonymous said...

Modelos...
Como seguir um
Se não há modelo nenhum.
Epicuro.

Unknown said...

"Há alguma necessidade de haver modelos?"

Há uma necessidade humana de saber que a vida que vive tem algum significado, seguindo um modelo seria mais fácil identificar isso.
E ainda tem o fato de ser tão difícil tomar decisões.

Eu parto do princípio que modelos não existem, apenas o que se cria para si próprio.

NeO R. said...

"Vivam os loucos que inventaram o amor!"

=p

Anonymous said...

o ''mundo das idéias'' é atualmente discussão entre historiadores da filosofia. acontece que uma analise da obra platonica em sua lingua original mostra que esse termo nao foi criação sua. os em-sis platonicos, segundo sua obra, não tem espaço ou tempo definido.

enfim, acho interessante que alguem que chame qualquer coisa de filosofia soubesse que apoiou uma "argumentação" em um grande erro de interpretação.